Saber como lidar com dados desbalanceados pode fazer toda a diferença no no seu projeto de Data Science e no desempenho do seu modelo de Machine Learning.
Você provavelmente já se deparou com a situação de encontrar um dataset onde havia um nítido desequilíbrio entre as amostras de suas diferentes classes.
Alguns exemplos de situações onde o desbalanceamento é quase certo são problemas de detecção de fraude e diagnóstico médicos – é intuitivo pensar que existem mais transações lícitas que criminosas, ou que o conjunto de pessoas diagnosticadas com câncer é bem menor que o conjunto de pessoas sem a doença.
Ignorar esse fato e treinar um algoritmo em cima do conjunto de dados original, pulando uma etapa intermediária de balanceamento dos dados, pode ter impactos diretos no seu projeto de Data Science.
Consequências dos dados desbalanceados
Se você está construindo um modelo de machine learning para classificação, por exemplo, a consequência desse desequilíbrio é que o modelo terá uma tendência a dar muitos “alarmes falsos“.
Ou seja, na prática ele irá responder muito bem entradas para as classes majoritárias, mas terá um desempenho inferior para as minoriárias.
No exemplo de detecção de fraude com cartões de crédito (onde o número de transações financeiras normais é bem maior que o número de transações fraudulentas), um classificador tenderá a apresentar muitos falsos negativos – uma situação indesejável para um banco, obviamente.
Em um trade-off, seria preferível “errar para mais” e ter uma quantidade maior de falsos positivos. Aliás, aposto que você já teve seu cartão bloqueado preventivamente e teve que ligar no banco para confirmar as últimas compras que havia feito, não é mesmo?!
Teoricamente, um dataset que possua qualquer classe com mais de 50% das entradas já é considerado desbalanceado. No entanto, há situações extremas onde você vai encontrar proporções maiores que 99:1.
Existem várias abordagens para lidar com dados desbalanceados, cada uma com seus prós e contras. Neste artigo, irei mostrar alguns dos métodos mais populares para você incluir desde já no seu arsenal.
Métodos para lidar com datasets desbalanceados
Há diversas maneiras para atacar o problema de dados desbalanceados, que envolvem desde a construção de algoritmos específicos até a aplicação de algoritmos mais avançados como Recognition-based Learning e Cost-sensitive Learning.
No entanto, uma outra abordagem bem mais simples tem sido amplamente usada (com ótimos resultados), a abordagem sampling.
Sampling é um pré-processamento que visa minimizar as discrepâncias entre as classes por meio de uma reamostragem. Para gerar um conjunto balanceado, são usadas normalmente as seguintes técnicas:
- Over-sampling: cria novas observações da classe minoritária a partir das informações contidas nos dados originais. Essa geração de novas entradas pode ser feita aleatoriamente com o auxílio de técnicas de clustering ou sinteticamente.
- Under-sampling: reduz o desbalanceamento do dataset focando na classe majoritária. Ou seja, elimina aleatoriamente entradas da classe com maior número de ocorrências.
Além dessas duas técnicas de sampling, existem também os advanced sampling methods, como SMOTE e ADASYN, onde instâncias são adicionadas ou removidas adaptativamente. Caso tenha curiosidade em conhecer mais e se aprofundar no assunto, recomendo o este artigo científico.
Vantagens e desvantagens de cada técnica
O Teorema No Free Lunch diz que não existem uma solução perfeita e única, apenas com vantagens. Cada escolha uma renúncia, isso é Data Science. Quando você opta por uma abordagem, tem que estar ciente das limitações e implicações nos seus resultados – e transmitir isso para os stakeholders.
O Over-sampling replica os dados já existentes, aumentando o número de instâncias das classes minoritárias. A vantagem é que nenhuma informação é descartada, porém o custo computacional será elevado e você irá deteriorar a performance do algoritmo para as classes minoritárias.
Já o Under-sampling vai extrair um subconjunto aleatório da classe majoritária, preservando as características da classe minoritária, sendo ideal para situações onde você tem grandes volumes de dados. Apesar de reduzir o tempo computacional e de armazenamento, esta técnica descarta informações da classe majoritária, o que pode levar a uma performance inferior nas predições dela.
Balanceando dados na prática
Para mostrar como balancear um dataset na prática, vou usar dados públicos de transações financeiras disponibilizados por empresas de cartões de crédito neste link. Para ver o código completo, basta clicar no botão abaixo e acessar meu repositório no Github:
Como é característico desse tipo de problema, as instâncias possuem distribuições bem discrepantes entre as classes normal
(0) e fraude
(1).
# importar os pacotes necessários
import pandas as pd
import matplotlib.pyplot as plt
import seaborn as sns
from sklearn.linear_model import LogisticRegression
from sklearn.metrics import classification_report
from sklearn.model_selection import train_test_split
from sklearn.metrics import roc_auc_score, roc_curve, accuracy_score
from imblearn.under_sampling import RandomUnderSampler
# configurar o estilo dos gráficos com o Seaborn
sns.set_style('dark')
Acima, importei todas as bibliotecas que serão usadas neste artigo. Na sequência, importei o arquivo csv
para dentro de um estrutura dataframe do pandas
e imprimir a contagem de valores únicos para os labels.
Representando 0,17% do total de instâncias, é nítida a discrepância e desbalanceamento dos dados. Mal conseguimos ver a barra da nossa variável alvo para instâncias de fraude (df.Class == 1
).
file_path = "https://www.dropbox.com/s/b44o3t3ehmnx2b7/creditcard.csv?dl=1"
# importar os dados para um dataframe
df = pd.read_csv(file_path)
# ver o balanceamento das classes
print(df.Class.value_counts())
print("\nFraudes representam {:.4f}% do dataset.\n".format((df[df.Class == 1].shape[0] / df.shape[0]) * 100))
# plotar gráfico de barras para as Classes
sns.countplot('Class', data=df);
Para você ter um ideia real das consequências dessa situação, vou construir dois modelos de Regressão Logística. No nosso primeiro modelo, separei as variáveis X
e y
normalmente e dividi entre conjuntos de treino e teste, como é praxe em machine learning.
Sem maiores ajustes, treinei o modelo usando o método fit(X_train, y_train)
e fiz a previsão de valores em cima do conjunto de teste (X_test
). Na sequência, plotei a matriz de confusão e o relatório de classificação.
# separar variáveis entre X e y
X = df.drop('Class', axis=1)
y = df['Class']
# dividir o dataset entre treino e teste
X_train, X_test, y_train, y_test = train_test_split(X, y, stratify=y, shuffle=True)
# instanciar e treinar um modelo de Regressão Logística
model = LogisticRegression()
model.fit(X_train, y_train)
# fazer as previsões em cima dos dados de teste
y_pred = model.predict(X_test)
y_proba = model.predict_proba(X_test)
# plotar a matrix de confusão
skplt.metrics.plot_confusion_matrix(y_test, y_pred, normalize=True)
# imprimir relatório de classificação
print("Relatório de Classificação:\n", classification_report(y_test, y_pred, digits=4))
# imprimir a acurácia do modelo
print("Acurácia: {:.4f}\n".format(accuracy_score(y_test, y_pred)))
# imprimir a área sob a curva
print("AUC: {:.4f}\n".format(roc_auc_score(y_test, y_pred)))
Conseguimos uma acurácia de 99,88% no nosso modelo de machine learning. Você considera esse um bom resultado?
Bem, acurácia global foi alta, mas o que dizer daquele fator que mais importava para nós, a capacidade de detectar fraudes no cartão de crédito?
Aí é outra história… por causa do desbalanceamento de dados, o modelo foi capaz de classificar bem as instâncias onde df.Class == 0
(transações normais), mas acertou menos de 60% dos casos em que df.Class == 1
.
Vamos ver agora qual seria o resultado caso tivessemos usado a técnica Under-sampling. Para facilitar esse pré-processamento, vou usar a biblioteca imblearn
com sua classe RandomUnderSampler
e chamar o método fit_sample(X_train, y_train)
.
Note como eu estou usando o under-sampling em cima do conjunto de treino, e não de todos os dados. Isso é muito importante para não desconfigurarmos a característica de teste original.
# usar técnica under-sampling
rus = RandomUnderSampler()
X_res, y_res = rus.fit_sample(X_train, y_train)
# ver o balanceamento das classes
print(pd.Series(y_res).value_counts())
# plotar a nova distribuição de classes
sns.countplot(y_res);
Agora, o novo conjunto está corretamente balanceado, eliminando boa parte do problema que tínhamos inicialmente.
Novamente, vou instanciar um novo modelo de Regressão Logística e treiná-lo nesses dados balanceados. Vamos dar uma olhada nas métricas de avaliação que foram usadas, e ver o que mudou.
# instanciar e treinar um modelo de Regressão Logística
model_res = LogisticRegression()
model_res.fit(X_res, y_res)
# fazer as previsões em cima dos dados de teste
y_pred_res = model_res.predict(X_test)
y_proba_res = model_res.predict_proba(X_test)
# plotar a matrix de confusão
skplt.metrics.plot_confusion_matrix(y_test, y_pred_res, normalize=True)
# imprimir relatório de classificação
print("Relatório de Classificação:\n", classification_report(y_test, y_pred_res, digits=4))
# imprimir a acurácia do modelo
print("Acurácia: {:.4f}\n".format(accuracy_score(y_test, y_pred_res)))
# imprimir a área sob da curva
print("AUC: {:.4f}\n".format(roc_auc_score(y_test, y_pred_res)))
Repare que apesar da acurácia ter diminuído minimamente, tivemos um aumento significativo na capacidade do modelo em detectar fraudes.
Apenas pelo fato de balancearmos os dados, melhoramos diversos parâmetros como recall
e a área sob a curva (AUC), que são métricas extremamente importantes para o problema que estamos lidando.
Dados desbalanceados no mundo real
São diversos os motivos que permitem que os dados sejam desbalanceados. Pode ser que o cientista de dados não conseguiu coletar igualmente dados de cada classe, ou que a amostra de fato reflita a população, desbalanceada.
Independente dos motivos, o não tratamente desse desbalanceamento afetará negativamente o desempenho do modelo, refletindo na qualidade global do seu projeto de Data Science.
Não existe um método universal e ótimo. Existem técnicas que evoluem constantemente, e cabe a você identificar os prós e contras de cada uma.
Por isso, recomendo não acompanhar apenas sites como o Kaggle, mas também acompanhar papers e trabalhos acadêmicos que tragam pesquisas nessa área tão importante.
Excelente material compartilhado; além da sugestão do artigo científico da técnica! Obrigado!
Olá Carlos,
Estou trabalhando em uma monografia e vou utilizar a técnica de regressão logística. Como meus dados estão bem desbalanceados, terei que corrigir isso usando uma das técnicas sugeridas (under-sampling no caso).
Você possui alguma indicação de leitura para eu embasar teoricamente essa decisão? Como é um TCC, seria interessante eu ter esse respaldo.
Valeu!
Jonas, essa abordagem deve ser orientada ao problema. Faça uma varredura na literatura (pelo Google Acadêmico mesmo) sobre machine learning aplicado ao seu problema. Leia o que foi feito em bons papers na seção de Materiais e Métodos. Isso irá abrir a sua mente e ajudar muito a começar.